Numa civilização paradoxalmente ferida pelo anonimato e, simultaneamente, obcecada com os detalhes da vida alheia, descaradamente doente de curiosidade mórbida, a Igreja tem necessidade de um olhar solidário para contemplar, comover-se e parar diante do outro, tantas vezes quantas forem necessárias.
Neste mundo, os ministros ordenados e os outros agentes de pastoral podem tornar presente a fragrância da presença solidária de Jesus e o seu olhar pessoal.
A Igreja deverá iniciar os seus membros – sacerdotes, religiosos e leigos – nesta «arte do acompanhamento», para que todos aprendam a descalçar sempre as sandálias diante da terra sagrada do outro (cf Ex 3,5).
Devemos dar ao nosso caminhar o ritmo salutar da proximidade, com um olhar respeitoso e cheio de compaixão, mas que ao mesmo tempo cure, liberte e anime a amadurecer na vida cristã.
Hoje mais do que nunca precisamos de homens e mulheres que conheçam, a partir da sua experiência de acompanhamento, o modo de proceder onde reine a prudência, a capacidade de compreensão, a arte de esperar, a docilidade ao Espírito, para no meio de todos defender as ovelhas a nós confiadas dos lobos que tentam desgarrar o rebanho.
Precisamos de nos exercitar na arte de escutar, que é mais do que ouvir. Escutar, na comunicação com o outro, é a capacidade do coração que torna possível a proximidade, sem a qual não existe um verdadeiro encontro espiritual.
Escutar ajuda-nos a individuar o gesto e a palavra oportunos que nos desinstalam da cómoda condição de espectadores. Só a partir desta escuta respeitosa e compassiva se podem encontrar os caminhos para um crescimento genuíno, pode despertar o desejo do ideal cristão, o anseio de corresponder plenamente ao amor de Deus e o anelo de desenvolver o melhor de quanto Deus semeou na nossa própria vida.
Papa Francisco
Exortação apostólica «Evangelii Gaudium / A alegria do evangelho» §§ 169-171 (trad. © copyright Libreria Editrice Vaticana, rev)